terça-feira, 22 de junho de 2010

Aprender a ser cristão: dignidade e espiritualidade

Prof. José Pereira da Silva


“É necessário aprender a viver a qualidade alta da vida cristã”, disse o Papa João Paulo II, encerramento do Grande Jubileu do Ano 2000 . Ser cristão é uma alegria, uma missão e um desafio, principalmente no mundo atual.
Essa consciência da dignidade de ser cristão e suas exigências, encontramos desde o início da Igreja. Dizia São Leão Magno (440-461): “Demos graças, portanto, irmãos bem-amados a Deus Pai, seu Filho, no Espírito santo. Porque, na sua grande misericórdia e no seu amor por nós, Ele teve piedade de nós.Quando estávamos mortos pelo pecado, Ele fez -nos tornar a viver por Cristo, querendo que sejamos n’Ele uma nova criação, uma nova obra das suas mãos (Ef 2,4-5;2 Cor 5,1-7).(...) Cristão,toma consciência da tua dignidade.”(1 Sermão para Natividade do Senhor).
O comportamento cotidiano e os costumes da maioria não podem ser o modelo do engajamento cristão. O cristão é orientado pelo Evangelho e pela fé em Cristo. Deve-se então agir para que a fé dirija a vida e não o contrário. Lemos em São Paulo: “Somos, pois, embaixadores de Cristo, e é Deus mesmo que exorta através de nós” (2 Cor 5,20).
Para isso é preciso uma profunda experiência de Deus através de uma espiritualidade cristã, para isso é preciso voltar às fontes dessa espiritualidade. É preciso atenção à vida espiritual, à presença escondida de Deus em nós, à sinceridade da consciência e à purificação, à conversão do coração.
O cristão não deve se descuidar do crescimento interior, que consiste no conhecimento de Deus. Somente o amor divino nos faz abrir o coração aos demais e nos torna sensíveis às suas necessidades, fazendo-nos considerar todos como irmãos e irmãs e convidando-nos a responder com amor ao ódio e com perdão à ofensa.
Fazer a experiência pessoal de Deus na própria vida. É necessário que aprofundemos na vida aquilo que professamos na fé. Às vezes, repetem-se, por isso, de maneira pobre, fórmulas que não constituem uma conquista pessoal, uma conquista da inteligência e de experiência vivencial. É a exigência de encarnar a experiência da fé na realidade (unir fé e vida).
A espiritualidade cristã se parece com a umidade e a água que mantêm a relva molhada, para que esta esteja sempre verde e em crescimento. Não se pode ver a água e a umidade do gramado, mas sem elas a relva fica seca. O que se vê é o gramado, com seu verdor e sua beleza. E é o gramado que queremos cultivar. Mas sabemos que, para tanto, devemos regá-lo e mantê-lo úmido. O gramado, a relva, representa a vida das pessoas . A água é a vida de Deus que nos é comunicada. No episódio da samaritana, Jesus nos ensina que não podemos extrair totalmente essa água de nós mesmos e que se trata de uma água que deve durar para sempre: “Se conhecesses o dom de Deus e quem é que te diz ‘Dá-me de beber’, tu é que lhe pedirias e ele te daria água viva! (...) Aquele que bebe desta água (do poço) terá sede novamente; mas quem beber da água que eu lhe darei nunca mais terá sede”(Jo 4,10-14).
Essa água se traduz para nós como motivações e inspiração para trabalhar, lutar, sofrer, viver sem egoísmo, viver de maneira digna e humana. A fonte da espiritualidade e mística cristã é uma experiência e um encontro, ou seja, com a Pessoa de Jesus Cristo. Lemos no documento de Aparecida: “A todos nos toca recomeçar a partir de Cristo, reconhecendo que não se começa a ser cristão por uma decisão ética ou uma grande idéia, mas pelo encontro com um acontecimento, com uma Pessoa, que dá um novo horizonte à vida e, com isso, uma orientação decisiva” (n.12).
A espiritualidade é a motivação que impregna os projetos e compromissos da vida. A espiritualidade cristã tem sua fonte na experiência de fé. Não a fé em Cristo e seu Evangelho pura e simplesmente, mas em Cristo e seu Evangelho feitos experiência. A espiritualidade cristã é a motivação que se refere explicitamente a Jesus, seu Evangelho e a justiça de seu Reino.
A espiritualidade representa a busca por vivacidade e a libertação dos grilhões da mediocridade que amortecem o espírito. Devemos experimentar o amor de Deus, como diz Thomas Merton: “Há muitos cristãos que não apreciam a dignidade magnífica de sua vocação para a santidade, para o conhecimento, o amor e o serviço de Deus. Há muitos cristãos que não se dão conta das possibilidades que Deus colocou na vida de perfeição cristã – possibilidades de satisfação no conhecimento e amor dele. Há muitos cristãos que praticamente não fazem a mínima idéia do amor imenso que Deus tem por eles, e do poder desse amor de fazer-lhes o bem, de lhes dar felicidade”.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Corpus Christi: A Eucaristia, dom de Deus para a vida do mundo


Prof. José Pereira da Silva


Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo (Corpus Christi), na qual celebramos a instituição da Eucaristia, sacramento da doação, morte e ressurreição de Jesus.
A solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo é uma celebração que tem raízes profundas na piedade do povo cristão. Surgiu como resultado da devoção eucarística, iniciada na França e na Bélgica, e que do século XII em diante se desenvolveu, acentuando particularmente a presença real de Cristo no sacramento e, portanto, a sua adoração. Certamente, foram as visões de Juliana de Cornillon, monja agostiniana de Liège (Bélgica), que tiveram influência decisiva na instituição da festa para toda a Igreja, realizada pelo Papa Urbano IV, em 1264.
A Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo é um eco da última ceia do Senhor com os seus discípulos. O povo exprime a grandeza de sua fé e de sua devoção à Eucaristia pelas procissões e por inúmeras manifestações de piedade.
A Eucaristia é, por excelência, mistério da fé. A fé da Igreja é essencialmente fé eucarística e alimenta-se, de modo particular, à mesa da Eucaristia.
A festa é expressão pública da fé na presença de Cristo em sua Igreja por meio da Eucaristia, que congrega seu povo e o confirma na unidade pela participação à mesa da comunhão do Corpo e Sangue do Senhor. “A Igreja pode celebrar e adorar o mistério de Cristo presente na Eucaristia precisamente porque o próprio Cristo se deu a ela no sacrifício da cruz”(Sacramentum Caritatis,14).
Na solenidade do Corpo de Cristo, louvemos a Deus porque ele continua derramando seu amor em nós pelo Espírito Santo e nos alimentando com a Eucaristia, pão da vida (Jo 6,35).
Na celebração eucarística, realiza-se a promessa de Jesus: “Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Quem come deste pão viverá para sempre. E o pão que eu vou dar é a minha própria carne, para que o mundo tenha vida” (Jo 6,51).
Comendo do pão e bebendo do cálice da Eucaristia, recebemos Jesus como alimento e bebida: sua vida doada para a vida do mundo, até que a efusão de seu sangue torne-se nossa vida, para a eternidade. “Assim Jesus manifesta-se como o pão da vida que o Pai eterno dá aos homens” (Sacramentum Caritatis,7).
A Eucaristia é o memorial da vida e morte de Jesus, é dom que comunica seu amor e sua vida. Da parte dos seguidores de Jesus, a Eucaristia é aceitação que gera nova conduta. O dom recebido impulsiona à doação. É o amor que responde com gestos de amor solidário.
A Eucaristia é memorial de Deus que atuou e continua presente na história. Por isso, a Eucaristia é uma memória, aberta, ágil e transformadora, que impulsiona na busca do novo céu e da nova terra, comprometendo a organização e a vivência de relações sociais e comunitárias à luz do projeto de Jesus.
Participar da Eucaristia, memorial vivo da entrega de Jesus, deve provocar em nós ações como as de Jesus. Celebrar em memória dele significa fazer o que ele fez – ser alimento para a vida do mundo.
O encontro com Cristo, aprofundado na Eucaristia, suscita em cada cristão, a urgência de testemunhar e de evangelizar. Entrar em comunhão com Cristo no memorial da Eucaristia significa, ao mesmo tempo, experimentar o dever de fazer-se missionário do acontecimento libertador atualizado pela celebração eucarística. O Senhor nos envia a impregnar a sociedade dos valores da Eucaristia.